É fácil e até politicamente correto, conforme vocabulário em voga, indignar-se com os atos corruptos, nepotistas e até imorais, no mínimo, de alguns dos nossos políticos. Fácil de comentar, mostrar indignação, condenar e, logo depois, esquecer e levar a vida como ela é. Expressar a indignação e esquecer parece ser a regra.

O difícil mesmo está em reconhecer nossos “pequenos delitos” no dia a dia, aqueles para os quais, pensando bem, sempre temos uma justificativa na ponta da língua e a consciência deles pouco presente. Mas que são a origem de tudo que talvez venha a acontecer conosco um dia.

O dia está começando e nos damos o direito de estacionar, mesmo por momentos, em cima da faixa de segurança dos colégios, pois é mais prático ali deixar o filho, mesmo que com isso, além de expressamente proibido na legislação de trânsito, coloquemos em risco os outros alunos que por ali fazem sua passagem ao atravessar a rua. Mas isso continua acontecendo todos os dias.

E continuamos por aí afora no trânsito de cada dia, sempre achando que a razão está conosco e no final das contas, mesmo, não vai dar nada… estacionar em lugar proibido, obstruir o cruzamento, passar pelo sinal fechado, estacionar na frente da garagem dos outros, cortar pela direita, enfim, facilitar a nossa vida mesmo com essas “pequenas infrações”, já que as “grandes” são obras dos nossos políticos !

E a lista das “pequenas infrações”, aquelas que nos permitimos em nome da relatividade, vai aumentando. Não só no trânsito, mas no trabalho, na escola, na faculdade e até nos nossos momentos de lazer – ultrapassar pelo acostamento fica valendo, já que filas e engarrafamentos na ida para a praia são para os outros. Beber na frente dos filhos e dirigir.

Cinto de segurança nos pequenos? Para que mesmo? Aliás, só usamos os nossos para evitar as multas… Pare na saída dos colégios e veja quantos são os pais que colocam o cinto de segurança nos filhos pequenos.

Fica evidente a nossa hipocrisia social e até o oportunismo ao nos indignarmos publicamente nos jornais e outros meios de comunicação sobre os acontecimentos nacionais, enquanto em casa somos complacentes conosco mesmos, citando a impunidade de alguns de nossos políticos.

Isso tudo vai funcionando assim até o dia em que a soma dos nossos “pequenos delitos” acaba causando um dano considerável e, pior, quando envolve nossa própria vida pessoal, seja um acidente fatal ou uma morte inesperada, fruto da sociedade que nós mesmos criamos e na qual vivemos. Surge o momento da dor.

Momento, infelizmente tardio, em que nos indignamos e protestamos, através de passeatas e outros atos públicos, em busca de uma “consciência” social que deveria já estar presente nos nossos atos diários de convivência com nossos próximos e com todos os outros. Que bom seria para a sociedade que essa consciência em relação aos “pequenos” delitos surgisse antes do dano acontecido, da vida perdida, da agressão sofrida, que tiveram sua origem na nossa própria indulgência. Pense nos pequenos atos do seu dia a dia. “

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